Lovecraft é um nome que tem ressoado bastante nos últimos anos. Apesar de ter morrido na penúria (e com pesadelos que não consigo sequer imaginar), o escritor norte-americano é dado como inspiração por um número impressionante de artistas de diferentes áreas. Os videojogos não são excepção, como comprova Bloodborne. Sundered não é exactamente Bloodborne (até porque a Thunder Lotus Games não tem a experiência da FromSoftware), mas os dois títulos partilham alguns aspectos de design.
Sundered é um jogo de acção 2D ao estilo de metroidvania. Para os leigos, isto quer dizer que o jogador percorre um mundo aberto formado por diferentes áreas interligadas. O acesso é limitado pelo catálogo de ferramentas e habilidades da personagem (à la Metroid e Castlevania, como “metroidvania” sugere), o que resulta em inúmeras passagens pelos mesmos lugares. Sundered consegue evitar o marasmo com estéticas distintas para cada zona e ao repopular as mesmas de forma procedimental.
O resultado é mais incoerente do que seria de esperar dos criadores de Jotun. No melhor dos casos, a adrenalina é viciante e o combate digno de um filme animado japonês; mas quando o algoritmo responsável pela escolha do tipo de inimigos e dos números dos mesmos decide encher o ecrã, é complicado compreender o que se passa e a morte assume-se inevitável. À boa moda antiga, um ecrã cheio dos inimigos mais difíceis torna a experiência frustrante e confusa, mas o nível de desespero raramente se torna insuportável. Os jogadores mais sensíveis ao stress poderão sofrer de um caso ou outro de rage quit, mas para os veteranos do género e os fãs da FromSoftware deverá estar tudo dentro das contrapartidas habituais.
De uma geração que nos deu clássicos de ficção científica, H. P. Lovecraft foi o nerd-mor, abordando os temas predominantes do género de uma forma particular: enquanto a maioria se focava na relação do Homem e a sua criação com o mundo, Lovecraft preocupava-se com os limites não explorados da psique humana. Sundered tem a coragem de explorar não só a estética de Lovecraft, com animações desenhadas à mão e uma direcção artística belíssima, mas também os temas.
A narrativa segue a tendência crescente do minimalismo e da ausência de exposição, confiando na capacidade do jogador, e a viagem vale a pena mais do que uma vez para conseguir os diferentes finais. Ao estilo de Oddworld: Abe’s Oddysee, o desfecho depende do perfeccionismo do jogador e de algumas decisões que terá de tomar ao longo da aventura, e o mais engenhoso é a forma como o conceito funde as temáticas da obra de Lovecraft e as mecânicas de Sundered.

Potencialmente frustrante demais para uma boa fatia dos jogadores, é mais fácil recomendar Sundered para fãs do género metroidvania e quem goste de um bom desafio com uma história interessante por trás, ainda que sem exposição. Contudo, e apesar dos seus méritos (em parte vítima do seu tempo, marcado pela saturação do mercado), é difícil imaginar Sundered a reclamar um espaço na memória da indústria. Não por isso, é um jogo que merece a atenção de todos os que guardam apreço por jogos como Metroid, Castlevania, e mesmo Bloodborne ou até The Legend of Zelda.

O código para análise foi cedido pela Thunder Lotus Games.