Se existe algo que aprendemos durante as últimas duas gerações de consolas é que a nostalgia vende. E bem. Se calhar a nossa geração está a ter uma das maiores crises de identidade de sempre, mas às vezes sinto que estou a jogar mais homenagens do que jogos originais.
Um atrás do outro, bons e maus, muito descarados e outros um bocadinho mais comedidos. É todo um mundo.
Cursed Castilla, também conhecido como Maldita Castilla EX, é um desses jogos. Uma homenagem, dizem eles, aos tempos gloriosos dos 8 ou 16bits, onde apenas os verdadeiros jogadores eram capazes de terminar um jogo. A pixel art era uma religião, as arcadas ainda estavam cheia de jovens e daqueles velhos estranhos e que nunca ninguém conhecia, e as bandas sonoras eram compostas por sintetizadores e chips de som que levavam os nossos pais à loucura. Agora imaginem isso tudo, mas lançado este ano e para a PS4.
Não quero parecer demasiado injusto, até porque Cursed Castilla é um bom jogo. Inspirado em Ghosts & Goblins e Castlevania, o título de ação e plataformas de Locomalito e Gryzor87 transporta-nos para um passado onde a dificuldade era o prato do dia e o desespero a sobremesa. A fórmula mantém-se praticamente inalterada, com o jogo a colocar-nos num ambiente medieval onde teremos de lutar contra as forças do mal para proteger o nosso reino e acabar com a maldição que nos assombra. Se já ouviram isto em qualquer lado, é totalmente normal.
Cursed Castilla emula perfeitamente os clássicos das arcadas ao dar-nos uma jogabilidade sem piedades. Os níveis são extensos, entre-calados por checkpoints e mini-bosses, e repletos de perigos e inimigos cujos padrões parecem ter sido elaborados por uma equipa de sádicos. Cursed Castilla quebra o ritmo ao adicionar novos desafios aos jogadores mais corajosos. Em cada um dos níveis vão poder encontrar itens secretos que desbloqueiam novas secções e que vos ajudam a atingir a tão cobiçada pontuação máxima. Mas como seria de esperar, estes objetos estão escondidos nas fases mais complexas de cada nível e muitos obrigam à descoberta de uma chave para conseguirem abrirem o novo caminho – e este processo tem de ser terminado sem morrerem. E claro, não nos podemos esquecer dos troféus!
Tal como em Ghosts & Goblins, temos várias armas à nossa disposição, como o já conhecido machado (que é lançado em arco) ou as adagas (que se dividem em três), alguns poderes e itens de defesa. Mas ao contrário do clássico da Capcom, a nossa personagem não fica em cuecas sempre que é atacada. Nem pensar. Temos ao nosso dispor 3 corações antes de perdermos uma vida, uma compensação pela dificuldade que nos espera em cada um dos níveis. O sistema de checkpoints também foi alterado, deixando os jogadores recomeçar sempre que acabam uma das secções. No entanto, serão penalizados se perderem muitos continues.
Como seria de esperar, Cursed Castilla resume-se a saltar, disparar, baixar e morrer; um loop que dificilmente evitarão ao longo da campanha. A dificuldade é acentuada por perigos espalhados pelos níveis, como valas sem fim ou rios repletos de monstros, e ainda pelos inimigos mais organizados de todo o sempre, cujos padrões demonstram um verdadeiro amor pela dança contemporânea. Mas como em qualquer bom jogo do género, existe um período de habituação onde conseguimos compreender as mecânicas e perceber como podemos ultrapassar cada um dos perigos antes de sermos postos à prova.
Cursed Castilla distribui os seus desafios de uma forma positiva e recompensadora ao tentar evitar que os jogadores não se sintam frustrados pela dificuldade, mas sim num constante desafio. Esse é o objetivo do jogo, esse equilíbrio entre o desafio e a recompensa, mas devo admitir que cheguei a um ponto onde fui obrigado a desligar a consola e a repensar a minha vida antes de voltar ao ataque e finalmente perceber e ultrapassar o problema que tinha à minha frente. Não é injusto, é preciso prática e talento. Tal como nós gostamos, certo?
Este amor pelo classicismo vai, no entanto, aos extremos. Talvez seja uma tentativa sincera e quase canibalesca de manter todas as mecânicas tradicionais intactas, mas algumas escolhas assumem-se quase como desnecessárias. Sinto que estou sozinho neste ponto, mas não consigo compreender como é ainda temos títulos onde as nossas personagens são impulsionadas para trás quando são atacadas – o que nos leva muitas vezes a cair em valas e a ver o raio do Game Over – e cada salto é fixo e final e decisivo e sem possibilidades de ser controlado ou alterado no ar – portanto, com fé. Apesar de serem mecânicas que desculpo em jogos como Castlevania, não consigo compreender como é que ainda têm lugar na indústria atual.
Mas a nostalgia vende, não existem dúvidas. Sejam projetos mais ambiciosos ou títulos que se focam mais na homenagem, o passado veio para ficar e funciona agora como uma distração eficaz para as desilusões do presente. “Lembram-se do quanto era fixe ir às arcadas?”, pensamos nós enquanto nos apercebemos que não devíamos ter gasto dinheiro no Mirror’s Edge Catalyst. São nesses momentos que nos lembramos dos clássicos e os estúdios independentes têm conseguido captar todo esse imaginário das tardes depois da escola, onde o Templo do Jogos dava 85% a jogos que considerava maus.
Cursed Castilla não é Shovel Knight e nem precisa de o ser. É sim um jogo competente, desafiante, divertido nos seus melhores momentos e enfurecedor nos piores. É quase um clássico perdido disfarçado de homenagem, é um olhar para os títulos de plataformas e para a sua era dourada, especialmente no que toca à dificuldade. É todo um misto de sensações boas, mas nada originais. É um chá quente numa tarde fria. É uma memória. E por agora, isso é o suficiente.

O código para análise (PS4) foi cedido pela Abylight Studios.